No primeiro jogo como titular da Seleção
na fase final do Campeonato da Europa, Renato Sanches confirmou a imagem de um
futebolista invulgar: não é todos os dias que um adolescente com 18 anos pisa
um grande palco como se estivesse a jogar na rua do seu bairro; exerce
influência sobre a equipa como se fosse um veterano de muitas batalhas, ele que
acabou de chegar à 9ª internacionalização por Portugal; revela um talento
superior, dos mais exuberantes da montra europeia, e suscita a opinião de que a
procissão ainda só vai no adro, faltando-lhe ainda três ou quatro anos para
atingir o máximo daquilo que as suas qualidades permitem. Envolvido numa das
polémicas mais absurdas e infames que o futebol português conheceu nas últimas
décadas (inacreditável o modo como foi denegrido no talento só pela cor da
camisola que envergava), Renato Sanches tem conseguido prosseguir o caminho
imune a todas essas reservas transformadas em críticas sem sentido. O futebol
português ganhou uma estrela para os próximos 15 anos e muitos foram os que
puseram em causa das mais variadas formas.
Homem do jogo
No momento da divulgação dos 23 para o
Euro, poucos apostaram nele como escolha de Fernando Santos; integrado na lista
final, estalou a clivagem entre quem o queria no onze, quem o via melhor como
passageiro de um comboio em andamento ou, pura e simplesmente, como elemento
condenado ao afastamento. Renato melhorou sempre a equipa quando entrou (com a
Áustria não saiu do banco) e a reclamação da titularidade foi ganhando adeptos.
Já frente à Croácia foi dado como provável no onze mas só agora, nos
quartos-de-final com a Polónia, o selecionador foi sensível às vantagens de
tê-lo a jogar de início.
Considerado pela UEFA como melhor jogador
em campo nos dois últimos jogos (mesmo que o senso comum nos diga que foram
prémios exagerados, mais que não seja atendendo às sublimes atuações de Pepe),
Renato Sanches tornou-se uma grande figura do Euro. Pela tenra idade, pela
milionária transferência consumada para o Bayern Munique e até pela intervenção
de Carlo Ancelotti, seu futuro treinador, e que, antes mesmo do confronto com a
Polónia o considerou o melhor jogador do Euro.
O que disse Santos
Depois dos quartos-de-final, o
selecionador nacional remeteu o fenómeno para níveis mais elevados do que
nunca. Disse Fernando Santos que Renato o fazia lembrar "Mário Coluna no
seu início, em alguns aspetos". E concluiu com um enquadramento mais
preciso: "É um bocadinho mais rápido e quando ganhar todo o peso será
muito melhor do que é hoje, seguramente."
Não deixa de ser interessante a comparação
com um dos mais extraordinários e influentes jogadores de sempre em Portugal.
Mário Esteves Coluna carregou aos ombros um dos períodos mais brilhantes do
futebol nacional, à custa de argumentos que, nos dias de hoje, não são ainda
muito visíveis em Renato: autoridade, liderança, organização e poder de
persuasão. O tempo encarregar-se-á de o apetrechar com esses atributos que
identificam o Monstro Sagrado na história do jogo em Portugal. Até lá, o miúdo
vai revelando a brisa de inconsciência que torna tudo mais fácil; o lado
selvagem de quem ainda não foi totalmente domado, mesmo em cenários de elevada
responsabilidade; o arsenal de argumentos criativos com que ultrapassa o clima
de medo que tantas vezes se instala à sua volta. Ainda não é um líder da cabeça
aos pés. Mas já iniciou o processo que o conduzirá ao momento em que qualquer
sugestão em campo será entendida como uma ordem. Esse dia estará mais próximo
do que muitos imaginam.
Publicado no Record,
Autor: Rui Dias
http://www.record.xl.pt/internacional/competicoes-de-selecoes/europeu/euro-2016/grupos/grupo-f/portugal/detalhe/os-primeiros-passos-do-monstro-sagrado.html
http://www.record.xl.pt/internacional/competicoes-de-selecoes/europeu/euro-2016/grupos/grupo-f/portugal/detalhe/os-primeiros-passos-do-monstro-sagrado.html
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