Jorge Jesus tem o poder de decisão sobre todo o futebol no Sporting e esse pode ser um erro dos de Alvalade, que o Benfica também cometeu no passado. A solução está em encontrar um diretor desportivo que tenha ascendente sobre o treinador, que enquadre o talento e a criativade e o proteja de si próprio
A 14 de maio de 2010, o Benfica anunciou a renovação de contrato com Jorge Jesus, a quem deu mais dinheiro e mais poder. A partir desse dia, J.J. passou a decidir quem vinha e quem saía, e a estratégia do futebol – de todo o futebol profissional – teria o seu dedo. Jesus sempre quisera ser um treinador à portuguesa mas um manager à inglesa e deu ali os primeiros passos no caminho que começava na emancipação e acabaria, na cabeça dele, na plenipotência.
Havia um contexto que explicava isto.
Primeiro, os encarnados não eram campeões desde 2005 e tinham-no sido em 2009-10, com Jorge Jesus.
Segundo, Jesus cumprira a promessa e o Benfica passou a jogar o dobro, com um futebol de vertigem que encheu o estádio de gente e os adversários de golos. Basta recordar o que fizeram o Vitória de Setúbal (8-1), o Nacional (6-1), a Académica (4-0) ou a Olhanense (5-0) na Luz – pouco ou nada.
Terceiro, e este acabará por ser um tema recorrente na vida de Jesus, Pinto da Costa abriu-lhe a porta do Dragão antes de se decidir por André Villas-Boas. Com uma oferta milionária numa mão, Jesus estendeu a outra para renegociar o salário e as suas condições; Vieira deu-lhe um passou-bem e aquilo ficou ali acordado entre eles, como ficaria mais tarde, quando J.J. e PC voltaram a jogar o jogo da sedução e o presidente do Benfica
seguraria o treinador quando já ninguém o queria na Luz. O que aconteceu depois? Jesus foi à SIC garantir que sempre dissera aos seus colaboradores que iria “dar de calcanhar” quando um dia chegasse a um dos grandes, tal a superioridade tática que tinha sobre os outros; e Jesus foi à RTP despedir o guarda-redes Quim em direto, trocando-o por Roberto, o frangueiro dos ovos de ouro. O resto do filme é sabido por todos: um arranque desastroso. Derrota na Supertaça frente ao FCP, três pontos somados nos quatro primeiros jogos (perdeu contra Académica, Nacional e Vitória de Guimarães), uma desvantagem irrecuperável. Acabou a temporada e o Benfica contratou António Carraça para supervisionar o supervisor do futebol, mas também ele acabaria despachado por Jesus dois anos depois, ganhando o ou-eu-ou-ele gerido por Luís Filipe Vieira. Só Rui Costa teve um ascendente profissional sobre J.J. “É o único que percebe de futebol”, diria mais tarde o treinador, já no Sporting, e isto resume o eterno equilíbrio de forças na SAD encarnada durante seis épocas: o Benfica entendeu que Jesus fazia parte da estrutura e Jesus que era ele a estrutura. Não só por isso, mas também por isso, o treinador tricampeão saiu para Alvalade, deixando no ar a ideia de que o melhor Jesus era o Jesus controlado. Sem ninguém por perto para lhe fazer frente. J.J. tem tendência a perder-se nas suas viagens egomaníacas; com alguém a zurzir-lhe aos ouvidos e dizer-lhe não, J.J. joga com o que tem, e isso fá-lo bem, provavelmente melhor do que ninguém. Jorge Jesus chegou a este ponto no Sporting e fê-lo da mesma forma que o fizera na Luz: negociando. Bruno de Carvalho convenceu-se que aquilo que J.J. conseguiu em 2015-16 foi o suficiente para lhe estender o contrato no tempo, com mais um milhão de euros em cima da mesa e uma carta branca para contratações; e, uma vez mais, a aproximação de Pinto da Costa na pré-época engordou a lista de argumentos do treinador. O modus operandi é o mesmo, só mudam os intervenientes. A 19 de maio de 2016, BdC e J.J. puseram preto no branco e lançaram-se para a nova época. O treinador já tem a última palavra sobre tudo o que mexe no futebol do Sporting: os treinos e o secretismo dos mesmos, quem sai, quem fica e quem tem de ser contratado; e até pode definir o futebolista que dá entrevistas aos jornais. A reformulação do departamento de comunicação do Sporting, aliás, também passou por ele. Está como gosta, acima dele só o presidente, e isso pode ser uma das causas para este arranque engasgado dos de Alvalade, tal como na segunda época na Luz. Poder a mais. Os sintomas estão lá: a derrota em Vila do Conde, os dois empates com o Vitória de Guimarães e o Tondela, as exibições frouxas e os problemas defensivos que o cansaço da Champions ou a ausência de Adrien não podem explicar. Porque defender bem sempre fora a imagem de marca de Jesus. Porque os rivais, FC Porto e Benfica, também estão na Champions e também têm ou tiveram futebolistas titulares lesionados. E porque o Sporting se reforçou no mercado de transferências. Os jogadores que Jesus foi buscar são os mesmos que queria ou que já tivera na Luz, e isto não é novidade para ninguém – o técnico é de ideias fixas. Bryan Ruiz, Bruno César, Joel Campbell, Markovic, Elias e André, são desejos antigos como o tempo, que Jesus perseguiu até os ter. E, digo eu, quando uma das partes quer tanto a outra que tudo faz para a ter, esta última toma o amor por garantido, por mais asneiras que faça. Não está em causa a qualidade dos atletas, mas o compromisso dos mesmos com o trabalho e o passado recente pelos clubes por onde passaram. Markovic não é titular desde que saiu do Benfica, André é um “baladeiro” no Brasil, e Elias ninguém o entende. Estes três correm contra o tempo quando o tempo deles devia ser agora, mas Jesus não hesita em lançá-los no onze titular, porque se há alguém capaz de potenciar jogadores, inventar o quarto momento do futebol, de se bater de igual para com Guardiola enquanto anda sobre a água e ressuscista mortos, é ele. A criatividade e a capacidade de ler o jogo fazem tanto parte dele como a vaidade, o egocentrismo e a arrogância. Estes traços definem a sua personalidade e ele nunca mudará, porque não é suposto que o faça. Aliás, nem precisa de o fazer, porque já demonstrou ser capaz de triunfar, com estilo e sem perder aquele jeito pintas suburbano. O que ele precisa – e, por extensão, precisa o Sporting – é de um diretor desportivo que não seja o ‘inimigo’ Augusto Inácio ou o amigo da velha guarda que é Otávio Machado, sempre pronto a lançar-se para levar uma bala por ele. Fonte; http://tribunaexpresso.pt/opiniao/2016-10-24-Nunca-mudes-Jesus
seguraria o treinador quando já ninguém o queria na Luz. O que aconteceu depois? Jesus foi à SIC garantir que sempre dissera aos seus colaboradores que iria “dar de calcanhar” quando um dia chegasse a um dos grandes, tal a superioridade tática que tinha sobre os outros; e Jesus foi à RTP despedir o guarda-redes Quim em direto, trocando-o por Roberto, o frangueiro dos ovos de ouro. O resto do filme é sabido por todos: um arranque desastroso. Derrota na Supertaça frente ao FCP, três pontos somados nos quatro primeiros jogos (perdeu contra Académica, Nacional e Vitória de Guimarães), uma desvantagem irrecuperável. Acabou a temporada e o Benfica contratou António Carraça para supervisionar o supervisor do futebol, mas também ele acabaria despachado por Jesus dois anos depois, ganhando o ou-eu-ou-ele gerido por Luís Filipe Vieira. Só Rui Costa teve um ascendente profissional sobre J.J. “É o único que percebe de futebol”, diria mais tarde o treinador, já no Sporting, e isto resume o eterno equilíbrio de forças na SAD encarnada durante seis épocas: o Benfica entendeu que Jesus fazia parte da estrutura e Jesus que era ele a estrutura. Não só por isso, mas também por isso, o treinador tricampeão saiu para Alvalade, deixando no ar a ideia de que o melhor Jesus era o Jesus controlado. Sem ninguém por perto para lhe fazer frente. J.J. tem tendência a perder-se nas suas viagens egomaníacas; com alguém a zurzir-lhe aos ouvidos e dizer-lhe não, J.J. joga com o que tem, e isso fá-lo bem, provavelmente melhor do que ninguém. Jorge Jesus chegou a este ponto no Sporting e fê-lo da mesma forma que o fizera na Luz: negociando. Bruno de Carvalho convenceu-se que aquilo que J.J. conseguiu em 2015-16 foi o suficiente para lhe estender o contrato no tempo, com mais um milhão de euros em cima da mesa e uma carta branca para contratações; e, uma vez mais, a aproximação de Pinto da Costa na pré-época engordou a lista de argumentos do treinador. O modus operandi é o mesmo, só mudam os intervenientes. A 19 de maio de 2016, BdC e J.J. puseram preto no branco e lançaram-se para a nova época. O treinador já tem a última palavra sobre tudo o que mexe no futebol do Sporting: os treinos e o secretismo dos mesmos, quem sai, quem fica e quem tem de ser contratado; e até pode definir o futebolista que dá entrevistas aos jornais. A reformulação do departamento de comunicação do Sporting, aliás, também passou por ele. Está como gosta, acima dele só o presidente, e isso pode ser uma das causas para este arranque engasgado dos de Alvalade, tal como na segunda época na Luz. Poder a mais. Os sintomas estão lá: a derrota em Vila do Conde, os dois empates com o Vitória de Guimarães e o Tondela, as exibições frouxas e os problemas defensivos que o cansaço da Champions ou a ausência de Adrien não podem explicar. Porque defender bem sempre fora a imagem de marca de Jesus. Porque os rivais, FC Porto e Benfica, também estão na Champions e também têm ou tiveram futebolistas titulares lesionados. E porque o Sporting se reforçou no mercado de transferências. Os jogadores que Jesus foi buscar são os mesmos que queria ou que já tivera na Luz, e isto não é novidade para ninguém – o técnico é de ideias fixas. Bryan Ruiz, Bruno César, Joel Campbell, Markovic, Elias e André, são desejos antigos como o tempo, que Jesus perseguiu até os ter. E, digo eu, quando uma das partes quer tanto a outra que tudo faz para a ter, esta última toma o amor por garantido, por mais asneiras que faça. Não está em causa a qualidade dos atletas, mas o compromisso dos mesmos com o trabalho e o passado recente pelos clubes por onde passaram. Markovic não é titular desde que saiu do Benfica, André é um “baladeiro” no Brasil, e Elias ninguém o entende. Estes três correm contra o tempo quando o tempo deles devia ser agora, mas Jesus não hesita em lançá-los no onze titular, porque se há alguém capaz de potenciar jogadores, inventar o quarto momento do futebol, de se bater de igual para com Guardiola enquanto anda sobre a água e ressuscista mortos, é ele. A criatividade e a capacidade de ler o jogo fazem tanto parte dele como a vaidade, o egocentrismo e a arrogância. Estes traços definem a sua personalidade e ele nunca mudará, porque não é suposto que o faça. Aliás, nem precisa de o fazer, porque já demonstrou ser capaz de triunfar, com estilo e sem perder aquele jeito pintas suburbano. O que ele precisa – e, por extensão, precisa o Sporting – é de um diretor desportivo que não seja o ‘inimigo’ Augusto Inácio ou o amigo da velha guarda que é Otávio Machado, sempre pronto a lançar-se para levar uma bala por ele. Fonte; http://tribunaexpresso.pt/opiniao/2016-10-24-Nunca-mudes-Jesus
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